Buenas! Hoje deixei as novidades de lado e caí de cabeça em um discaço que descobri graças ao modo aleatório do YouTube (obrigado algoritmo). Em meio as minhas pesquisas em cima da obra do maestro Arthur Verocai, descobri o disco de estreia de Célia, uma cantora que desconhecia. E do qual o maestro fora um dos produtores.
Como começa a história de Célia
O ano é 1971, e a estudante de música chega por recomendação de Agostinho dos Santos à gravadora Continental. Esta resolve investir e diversificar o seu elenco que até então contava com apenas artistas sertanejos.

Com todos os recursos da gravadora e pela batuta dos maestros/produtores Rogério Duprat e Arthur Verocai, a paulistana executou uma obra-prima já na sua estreia. Com repertório assinado por diversos bambas, de Joyce Moreno, Ivan Lins e o povo de Minas, fez um disco que seria reverenciado tardiamente.
De voz grave e cristalina, sua interpretação é cheia de nuances. Vai da emoção mais carregada à um quase riso em sua voz de maneira leve, sem fazer força, sentindo cada palavra e cada nota tocada, num encontro pra lá de especial. Sua voz certamente é a cereja do bolo. De uma grandeza ímpar.
Sobre o álbum “Célia”, de 1971
Com uma banda afiadíssima, com direito a quarteto de cordas e naipe de metais, tocando absurdamente bem, executando os lindos arranjos criados de maneira magistral, é estranho que a única musicista citada no álbum é a violonista Elody (o grande elo entre Célia e grande parte dos compositores do álbum). Com arranjos que transitam entre o soul, o jazz e a bossa-nova, faz um disco clássico de música brasileira pra gringo nenhum botar defeito.
Solar, diverso, mas íntegro, nada soa fora do lugar, por mais diferentes uma das outras que algumas canções possam soar. E aqui temos no mesmo disco canções gravadas na década de 1930 por Carmen Miranda à canções inéditas do Clube da esquina, gravadas antes de Milton Nascimento. Mesmo com uma colcha de retalhos de referência, o disco soa coeso, quase como uma coletânea de grandes sucessos.

O disco fez um certo estardalhaço na época, Célia ganhou alguns renomados prêmios pelo álbum, incluindo o Roquette Pinto. Com o passar do tempo, a cantora foi caindo no esquecimento, mesmo mantendo-se na ativa por mais de 40 anos.
Após décadas na obscuridade, rappers estadunidenses redescobrem a obra do maestro Arthur Verocai e todos os álbuns ao qual ele havia produzido. Entre eles, esse aqui, a estreia de Célia, que foi reeditado nos EUA em vinil e caiu nas graças de DJ’s e MC’s ao longo do mundo. Com a redescoberta da cantora, seus discos passaram a ser objeto de culto de colecionadores, chegando esse de estreia custar acima dos R$ 1000,00.
Como não tenho essa grana, me contento com as reedições que custam uma parte disso e não tem o mesmo glamour de um disco de época. Mas serve ao meu propósito… o deleite sonoro.
E aí… Vale a pena?
Um disco incrível, sofisticado, mas que ao mesmo tempo é popular e te pega de jeito (não consigo tirá-lo do repeat). Precisou ser redescoberto fora do país para ter o devido valor que merece por aqui. Discoteca obrigatória para quem quer entender o quão incrível é a música brasileira quando conseguimos juntar em um mesmo álbum: grandes compositores, uma banda de respeito, um time formado por alguns dos mais incríveis maestros/produtores do país e uma voz incrível que merecia todas as reverências possíveis.
Uma pena Célia ter nos deixado em 2017 aos 70 anos, vítima de um câncer. Mas se despediu em grande estilo com o lançamento de um CD/DVD ao vivo (que se tornou póstumo), chamado “O que não pode mais se calar” que festeja toda a sua carreira no melhor estilo.
Gosta de música brasileira? Se a resposta for sim, baixe, compre, acesse, mas não deixe de ouvir essa pérola. Estou cada dia mais apaixonado pelo Brasil da década de 1970 (musicalmente e futebolisticamente apenas).
Logo menos tem mais.