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Wizards of The Coast deixa o Brasil

Talvez a notícia não seja tão contundente como deveria ser. E muita gente pode não ter ligado o nome da empresa ao jogo que ela está atrelado… Magic: The Gathering. Calma lá! O jogo não acabou por aqui, mas a representação oficial no Brasil sim. A notícia foi dada de modo informal pela agora ex-gerente de comunidade da Wizards of The Coast em seu perfil no Twitter. E segundo ela, o time da LATAM foi totalmente desligado. Por parte da WoTC, nenhuma palavra.

De modo informal, a ex-funcionária da WoTC Brasil informou o fim do braço nacional da empresa

Magic: The Gathering no Brasil

Eu admito que a notícia tem um tom alarmista, mas apesar do fim da representação nacional, isso não quer dizer que temos o fim do jogo no Brasil. Eu jogo Magic desde 1994, quando ainda o jogo ainda engatinhava e eram poucas as expansões. Comecei a jogar na edição Revised e depois conheci The Dark, Ice Age, Fourth Edition, Fallen Empires e outras edições vieram, a ponto de eu perder as contas de quantas edições são até o momento. Vi as primeiras cartas em português, as hoje disputadas 4ª edição borda preta e tenho muitas por aqui. E vi o jogo crescer absurdamente.

O jogo foi localizado em PT-BR a partir da 4ª edição

E foi só em 2016 que surgiu a WoTC Brasil. Assim, por mais de vinte anos o jogo sobreviveu no Brasil sem uma representação oficial. É claro que com a empresa estando oficialmente por aqui, muita coisa fica facilitada: eventos oficiais, acesso aos produtos da empresa e claro, dar suporte à comunidade. Que aliás, é bem grande por aqui. Mas é bom deixar claro: o jogo existiu e cresceu por aqui, mesmo sem a WtOC Brasil.

Os problemas do Magic

É perigoso criticar algo que é bastante popular e que é visto com muito carinho pela comunidade. Mas eu sempre vi problemas nesta representação nacional. Eu não posso responder pelos lojistas, pois sequer tenho contato com eles, mas até onde sei, a aquisição dos produtos não é feita diretamente com a Wizards… mas com distribuidoras que importam os produtos e abastecem o mercado nacional. Tenho conhecimento de pelo menos duas grandes distribuidoras: a Coqui e a Galápagos. Antigamente, também tínhamos a Devir. Mas parece que ela deixou este mercado.

O que restava para a WtOC Brasil então? Fazer o meio de campo entre as lojas e a Wizards e promover a integração entre os jogadores, estimulando o crescimento da comunidade. E é aí que eu acho que estava o grande problema do braço brasileiro.

A relação com os influenciadores e divulgadores do jogo

Em primeiro lugar, o Magic é divulgado por meio dos influenciadores e você tem vários deles na comunidade: Vitor (aka El Baramallo) do canal Fazendo Nerdice, Henrique do canal Blacker Lotus, Thiago do canal Diário do Planinauta, Luciano Guma do canal Guma Noob, André do canal Umotivo, Vinícius (aka Tio Vini) do canal Cabrito Montês e alguns outros que realmente não consigo me lembrar de memória. A própria Carolina Moraes, antes de trabalhar para a Wizards, também tinha o seu canal… o Multiverso Magic.

E qual é o problema disso? Bom… eles… e somente eles é que eram reconhecidos pela WoTC Brasil para eventos e para receber materiais de divulgação. Pois é… nós do UBQ por muitas vezes solicitamos materiais de divulgação para criarmos material sobre o jogo por aqui. E não estamos falando de presentes… estamos falando de datas, possíveis lançamentos, eventos, material de imprensa. Mas os “amiguinhos” que eu citei acima, todos eles tiveram acesso irrestrito ao evento e seus bastidores.

Solenemente ignorados

Chegamos ao ponto de passarmos o ridículo durante um Magic Fest lá pelos idos de 2018 (quando ainda era somente GP São Paulo). Na ocasião, nós pedimos de modo insistente informações sobre o evento. Foram e-mail e mais e-mails e fomos solenemente ignorados. Mas como eu frequentava uma loja grande, estava mais ou menos bem informado sobre o que seria o evento, mas como jogador, não como imprensa.

Ainda assim, preparamos uma equipe, preparamos nossos equipamentos e lá fomos nós para a cobertura do evento. E ninguém… nem da organização… nem da WoTC Brasil… ABSOLUTAMENTE NINGUÉM fez questão de nos atender, seja para entrevistas, seja para declarações, seja para algum suporte. Chegamos a abordar a própria Carolina no evento. Sua resposta foi: “Olha, precisa falar com a assessoria de imprensa. Entra em contato com eles para ver o que é possível”. Agradeci e saí. Acabamos fazendo uma cobertura informal, falando com jogadores, filmando o local e conversando entre nós mesmos.

Aliás, é preciso dizer que a Channel Fireball não deu suporte aos produtores de conteúdo. Apesar disso, a WoTC Brasil deu suporte. Somente para os membros da panela. É uma comunidade bastante fechada.

Sendo assim, o primeiro problema era justamente esse: a panela. Ou você é da panela, ou você não faz parte dos divulgadores de Magic. E por conta disso, na edição seguinte, optamos por sequer ir ao evento. Afinal de contas, de que adianta estar lá, e não ter nenhuma forma de feedback? Queríamos entrevistar a organização, alguém em nome da Wizards, cobrir os torneios que acontecem por lá. E isto tudo foi muito mal gerido.

O comércio de produtos selados

A Wizards of The Coast tem um produto à venda: cartas de Magic. Mas não as cartas avulsas. Ela vende os produtos de Magic em materiais selados: são Boosters, Bundles Packs, Challenger Decks, Commander Decks e outros packs promocionais. E convenhamos, não são produtos baratos. Em parte porque são todos importados, em parte porque historicamente os produtos são caros mesmo.

E no Brasil, normalmente os jogadores mais experientes e competitivos dificilmente compram produtos selados. Isso fica por conta dos novatos que não conhecem o jogo e acabam começando pelos selados. Mas com o tempo, percebem que é mais econômico comprar cartas avulsas em lojas ou em trocas com outros jogadores. E uma prática comum dos lojistas é abrir vários selados para ter as cartas e assim revendê-las ao público.

A Wizards não vende cards avulsos, mas produtos selados, que são bem caros

Desta forma, lojas pequenas compram poucos produtos selados dado o alto custo de investimento e baixo retorno em vendas e as lojas grandes compram em quantidade, mas boa parte vai para abastecer o mercado de cartas avulsas. E talvez isso não seja lucrativo para a Wizards.

A crise econômica

Pois é… ela chega em todas as instâncias. Até nos games. Muitas empresas estão demitindo e se reestruturando neste cenário pós-pandemia. São corte de funções, novas designações e muita gente está tendo que assumir novas atribuições com a extinção de outras vagas de trabalho.

A Wizards é parte de uma empresa maior, a Hasbro, que também está sendo afetada pela crise econômica e de acordo com notícia da agência Reuters, a empresa anunciou que cortaria cerca de 15% de sua força de trabalho em 2023. Então é natural que os cortes comecem pelas partes menos lucrativas da empresa.

E ok… podemos gostar do jogo, podemos ser fãs, podemos ter uma grande comunidade de jogadores, mas a América Latina como um todo é ruim em vendas, frente ao cenário global. Então, o corte talvez fosse até previsto para um observador mais atento.

O que temos no momento

No momento em que publicamos esta matéria, o que temos de concreto é o fim de um escritório nacional da Wizards e de um representante local. Os conteúdos continuam disponíveis de forma localizada, isto é, temos o site oficial em PT-BR, temos as coleções sendo lançadas com cartas em PT-BR, as lojas continuam recebendo normalmente produtos selados para a venda (considerando a ressalva do item anterior) e os torneios sancionados continuam acontecendo.

Site, cards, lojas, torneios sancionados, tudo continua na mesma

Não acho saudável perdermos uma representação local. Mas achei extremamente positivo a saída da equipe atual, principalmente na figura da ex-gerente de comunidade que pouco fez para fomentar novos jogadores e menos ainda fez para manter os jogadores felizes na comunidade e ativos. Ela talvez fosse querida pela sua bolha de influência, mas definitivamente, não tinha envergadura para ocupar a posição que tinha. Não agregou nada à marca ou ao jogo e talvez a WoTC tenha percebido o óbvio, Magic continuaria sendo bem vindo por aqui, com ou sem ela.

Sua saída talvez contribua com o fim da panela. Mas ao mesmo tempo – e em uma grande ironia – a saída dela representou o fim de qualquer outra representação nacional. Resta saber agora quem vai cuidar dos interesses da Wizards no mercado latino americano. Mandamos um e-mail para eles perguntando sobre isso.

E até agora, somente o silêncio… mas isso não é nenhuma novidade.

Em tempo…

Sim, eu continuo jogando Magic. Não tenho frequentado lojas porque o perfil dos jogadores é extremamente competitivo e poucos jogam apenas pela diversão e socialização. As lojas também estão focadas na promoção de eventos competitivos para lucrar com inscrições e venda de cartas avulsas, então nem sempre tem espaço livre para sentar e jogar um mesão for fun.

Restou-me as opções digitais… jogo Magic Arena e Magic On Line. Tenho minhas cartinhas, não gasto com novos cards a ainda me divirto. Pelo menos da forma que dá…

E vou continuar jogando Magic enquanto ele existir.

Publicado em:Bora Jogar!,Opinião

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