NOTA DA EDITORIA – A publicação deste texto deveria ter ocorrido em Abril/2019 por ocasião da posse Ministro da Educação. Por motivos diversos ficamos na dúvida sobre como publicaríamos esta carta aberta.
Prezado senhor,
Exmo. Ministro da Educação
Abraham Weintraub
Ditos populares só não são mais irritantes que chavões. Na verdade, são chavões escandidos e pretensiosos. Mas, devo lhe advertir, como dizia minha avó, que “o peixe morre pela boca”.
Seu antecessor, que também recebeu uma missiva deste Blog, andou falando mais do que fazendo. Ou se fez, o fez de forma muito discreta. Bem se diga que mandou um monte de gente embora, alguns se convidaram a se retirar e temos alguns postos vazios.
Então, comecemos por estes postos, melhor dizendo, pelo tamanho do seu ministério. O MEC – mesmo sem o “C” da Cultura – tem o segundo orçamento do governo. Tem uma estrutura imensa. São quase 280 mil servidores, destes 40 mil em “cargos de confiança”.
Só comparando, o Ministério (lá eles chamam de “Departamento”) da Educação dos Estados Unidos tem cinco mil funcionários, sendo o menor dos Departamentos do Governo Americano. E isso não se dá porque eles consideram que já fizeram o que tinham que fazer, que, sei lá, “a gente ganha um Nobel por ano, pra quê ficar se preocupando com Educação?
“Abra um puxadinho e põe lá um Ministério para a rapaziada não ficar chiando…”. Ocorre que a pasta da Educação lá sempre foi um puxadinho do Departamento de Saúde. Até 1979, ninguém havia se tocado que a nação mais rica do mundo não dispunha de um Departamento de Educação. O então presidente Jimmy Carter resolveu criar um, inicialmente – e até hoje é assim – para cuidar do ensino fundamental.
Que tal começar por lá, Ministro? Pelo ensino fundamental? Eu sei que tem o INEP e – vixe – um monte de Instituto, Secretaria, Autarquia, servidor a dar com o pau, mas… tem que começar por alguma coisa.
E aí basta que os professores ensinem os pirralhos a ler, a escrever, a fazer as quatro operações e, deixa ver, mais um monte de inutilidades. Sim, inutilidades. Deixe-me fazer esta citação aqui, Ministro:
“Aristóteles tinha razão quando dizia que o aprendizado das coisas inúteis é sumamente útil. É aprendendo capitanias Hereditárias, Mem de Sá e D. João VI que se forma o espírito cívico e a estima (o amor) pela pátria. É aprendendo mecanismos matemáticos, que a máquina de calcular vai esvaziar de qualquer utilização prática visível que se apura o senso lógico e se aviva o raciocínio.”
“É decorando vocabulário e submetendo Camões à aparente agressão da análise lógica que o homem se torna mais homem – “Homo sapiens” – isto é, que ele dá vigor e plenitude à palavra e à linguagem e, por meio delas ou dentro delas, à faculdade de pensar. É aprendendo filosofia (o mais inútil dos conhecimentos), as regras do raciocínio que se chega à mente sadia. E que falar da língua estrangeira?”
“Nem tudo, diz o filósofo, se ensina na escola, mas tudo se aprende, ou, ao menos, se começa a aprender. Não se ensina a amizade, a intuição, a sabedoria, mas é ensinando matemática e geografia que se aprende o amor e a amizade…”
A citação acima é de Dom Lourenço de Almeida Prado, reitor durante muito tempo do Colégio São Bento, no Rio. Seria interessante que o senhor lançasse mão do tempo que demandaria para esculhambar Paulo Freire e o deixasse para lá.
Certamente o senhor ministro conhece Dom Lourenço, mas se empolgue com as ideias dele. A parte boa é que não existe um “Método Dom Lourenço”. Aliás o “Método Paulo Freire” já é aceito por muitos como datado, ficar esculhambando um negócio que nem quem gosta usa mais – talvez para a alfabetização de adultos – é meio perda de tempo.
O legado de Paulo Freire ainda está entranhado em alguns dogmas (um país cuja Educação é cheia de dogmas vai chegar burro no apocalipse), como por exemplo a Progressão Continuada. Eis um exemplo clássico notadamente em SP, de como os tucanos pioraram uma horrenda ideia petista, introduzida por Freire quando Secretário da Educação de Erundina.
Mas até aí vai ser fácil, difícil vai ser dar uma garibada no que os entendidos chamam de “espírito crítico”. Nossos aluninhos são instados a criticar o que se convencionou chamar de “Sistema”.
E também a achar que lucro é ruim, que empresário é sempre mau (sem se tocar que a dona do salão de beleza que tem quatro funcionárias é uma empresária, e gente assim é a maioria do empresariado do país), que o agricultor tem escravos até hoje, que Cuba tem a melhor saúde do mundo.
Mais que isso acima, a eles é ensinada uma VERDADE, da qual quem descrê é Nazista. Mas isso o senhor também sabe.
Espírito Crítico é saber ler um contrato. Saber achar na conta de luz o quanto de imposto incide ali. É entender o “juros sobre juros” dos bancos. É saber o que houve em Auschwitz, e o que era um Gulag, o que foi a Grande Fome, o Holodomor. Saber sobre deveres e até onde vão seus direitos.
Há uma burocracia desgramada no Ministério e pode ser que o senhor se perca nela. No seu lugar eu nomearia um “tesoura” para sair cortando, e tentaria uma Cruzada em busca de novos valores na Educação Fundamental.
Impor um Plano Nacional de Diretrizes Educacionais – sempre é um nome assim – não deixa de ser um arroubo totalitário. Bóra fazer uma Carta de Intenções, Ministro, e que a turma da ponta se vire. Tem gente boa demais dando aula para a “petezada”, que só quer condições de trabalho.
Bem, não quero admoestá-lo mais. Desde que me conheço por gente, desejo boa sorte a todo ministro da Educação que assume. Então, que a paz e a clareza de ideias estejam com o Senhor.
Ah, Dom Lourenço não admitia mulheres como alunas no São Bento. Essa será a primeira, e única, discordância que o senhor ouvirá ao falar dele, não porque concordem com o resto, mas porque tem uma grande chance não conhecerem.
Basta dizer que hoje isso não faz o menor sentido (se é que fez um dia) e bola para frente!