O principal chamariz para a série Space Force da Netflix foi que ela marcava a volta dos idealizadores/produtores de The Office. Ainda bem que Sem Pipoca não viu nada, absolutamente nada de The Office. Porque o que era um simples chamariz acabou por ser uma pedra no sapato.
As críticas que choveram para a nova série tinham um tom de decepção por não ter sido como a antiga – pelo menos a primeira temporada. Talvez pelo fato de não ter assistido o trabalho que consagrou Steve Carell e Greg Daniels, gostamos deste que marca a volta da dupla.
O plot da série
O argumento parte de um projeto governamental que realmente existe: o de criar uma Força homônima, como um braço da Força Aérea dos Estados Unidos a fim de realizar ações de defesa no espaço. O projeto foi encampado por Trump e tido inicialmente como algo muito caro e até caricato – piorado pelo logotipo da nova Força ter sido inspirado (no caso copiado mesmo) da série Jornada nas Estrelas.
Aqui vemos a Space Force em pleno funcionamento, com seu comandante, Mark Naird, interpretado por Steve Carell, tentando viabilizar um empreendimento caro, confuso, contestado pelo Congresso e ridicularizado por pares. O antagonista do personagem de Carell, vivido por John Malcovitch, não é bem um vilão, mas algo como a personificação da realidade, tão incômoda a Naird. As tiradas dele ante às investidas tresloucadas do Comandante são ótimas e dão o tom da trama. Uma improvável cumplicidade entre os dois vai se consolidando à medida em que os episódios passam.
Trata-se de uma comédia para zombar dos tempos pré-pandemia. Sendo um projeto governamental, o Presidente é citado o tempo todo, porém seu nome nunca é pronunciado. Algumas congressistas da oposição ao atual governo são replicadas em personagens, e vemos Nancy Pelosi e Alexandria Ocasio Cortez ali caricaturadas bem como um deputado terraplanista.
Zombando do espírito do tempo
Mesmo o projeto em si é superdimensionado surrealmente, sendo a pretensão final espalhar bases militares pelo espaço a começar da lua (daí o slogan, representado no título acima). Essa característica de zombar do espírito do tempo talvez seja um fator limitante na série em relação a The Office, que fazia uma abordagem mais extemporânea do mundo corporativo.
Outro limitador são as tramas colaterais, que se apresentam naturalmente soltas mas que com o desenrolar da série continuam soltas. A esposa do Comandante, por exemplo, vivida por Lisa Kudrow (a Phoebe, de Friends) vai presa por ao que parece um crime grave. Mas não se sabe nada além disso e fica nisso. A filha do Comandante é uma adolescente chata que fica o tempo todo como adolescente chata mas até aí se compreende: como todos os adolescentes chatos, a chatice vai durar até a vida adulta.
Os laços entre os personagens vão se insinuando, como a dupla formada pela piloto do helicóptero de Naird e o cientista de ascendência oriental. Funciona como contraponto à dupla dos personagens de Carrel e Malkovitch mas com outra química. Tem o secretário de Naird, feito por Ben Schwartz, que é muito hilário e os pais demenciados do Comandante – estes sim, irritantemente fora de contexto mas talvez a intenção fosse essa mesmo.
E por que Space Force vale a pena?
“Space Force” vale porque é engraçada, espirituosa, inteligente, ainda que não seja uma perfeita obra de teledramaturgia. Mesmo as incongruências do roteiro parecem ser mais um convite a uma segunda temporada que derrapadas de continuidade. Ok, não é The Office. Mas é uma boa pedida.
Serviço
Space Force (id, EUA 2020) com Steve Carell, John Malkovitch, Ben Schwartz, Lisa Kudrow, Diana Silvers, Tawny Newsome, Jimmy Yang. Produtores executivos: Greg Daniels e Steve Carell. Disponível na Neflix
Post Scriptum
O comandante interpretado por Carell costuma cantar alto quando quer pensar. Logo no primeiro episódio manda Kokomo dos Beach Boys. A trilha sonora da série vale uma playlist.