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Um olhar sobre as névoas

Como eu disse no último podcast sobre a copa do mundo, eu evitei abordar um assunto pessoal aqui no UBQ. Eu não queria criar um alarido sobre algo que provavelmente poderá ser resolvido em breve. Eu também não queria criar mais uma vez aquele sentimento de pena ou comiseração que muitos nutririam por mim.

E principalmente porque eu não queria encher o saco de ninguém.

Sim… eu estou com cataratas. No plural… um tipo em cada olho. Para quem gosta de detalhes técnicos, no olho direito eu tenho catarata senil (de forma precoce, porque só tenho 48 anos) e no outro olho tenho catarata subcapsular.

Na prática, eu não enxergo… bom… enxergo, mas muito mal. Não consigo mais dirigir e faz pelo menos seis meses que estou em casa sem conseguir fazer minhas coisas. A sensação é de ter constantemente uma névoa ao meu redor. O olho direito é pior… eu simplesmente não vejo nada por ele. Alguns clarões apenas, mas não consigo distinguir forma ou cores.

No olho esquerdo, ainda tenho alguma visão… mas embaçada. Tenho que chegar a uns 10-15 centímetros para conseguir ter alguma visão. E ainda preciso de lupa e um óculos de grau forte para conseguir ver. Imagina uma folha de papel vegetal na sua frente… é exatamente assim que eu enxergo. Com isso, faz algum tempo que minha esposa, minhas filhas, meus gatos… todos eles são apenas vultos ou contornos na claridade.

E eu até tento ajudar de alguma forma.. tento lavar louça por exemplo… mas admito que faço a tarefa no automático e na confiança de que estou fazendo certo. Ana Paula nunca reclamou, mas tenho certeza que o processo de qualidade está a desejar.

E você deve estar se perguntando… mas como você conseguiu escrever textos, editar imagens e podcasts para o UBQ neste estado? A resposta: teimosia… muitas madrugadas acordadas, muito uso de ferramentas de acessibilidade do computador, lupas e lentes e muita ajuda da minha esposa. Eu sei que saiu muita coisa com algum errinho… uma letra trocada, uma imagem torta, mas eu sou um teimoso por natureza… e como a única coisa que me restava era o UBQ, pelo menos ele tinha que funcionar.

As coisas pioraram de forma rápida nos últimos meses. E claro que eu busquei tratamento, mas como muitos sabem, eu dependo da assistência médica do estado e assim como o SUS, tudo é moroso e leva tempo. Foram meses entre a primeira consulta, os exames diagnósticos e por fim o vislumbre da cirurgia. Aí… mais um obstáculo… as lentes precisam ser pagas… e são caras…

Até existe a previsão de uso de lentes gratuitas, mas pelo mesmo hospital do servidor, o prazo para obtê-las seria indefinido (sim… indefinido) pois simplesmente não existe uma previsão de atendimento. Assim, a opção é fazer a cirurgia pelo hospital conveniado ao hospital do servidor pagando pelas lentes.

E agora, depois de tantos meses… de tanto tempo sem enxergar o mundo como deveria, acho que agora no final de janeiro, finalmente farei a primeira cirurgia (uma para cada olho). A segunda cirurgia deve acontecer em fevereiro e lá para Março eu devo estar enxergando novamente.

Sim… eu sei que catarata é tratável… E a cirurgia é tecnicamente simples. Mas apesar de simples, ter catarata em estágio avançado é incrivelmente incapacitante. Depois que terminei o projeto “Uma Copa Qualquer” eu senti que foi na base de muita teimosia. E sinto que talvez eu tenha exigido um pouco demais da pouca visão que me resta no momento.

Hoje eu acordei e tudo estava nublado… tudo parecia de alguma forma pior. Tateei pelas paredes para chegar ao banheiro. Tateei pelas paredes para sentar no computador. Felizmente, ainda disponho da minha voz e o recurso de ditado por voz do Word realmente é muito bom.

Mas hoje, eu resolvi falar sobre isso porque sinto que estou no limite entre enxergar alguma coisa e ficar imerso em uma grande névoa que só existe em meus olhos. Que não me permite ver o mundo e fazer minhas coisas.

Então vim aqui e escrevi um pouco sobre isso… quero poder me lembrar da sensação e quem sabe daqui uns meses poder dizer que tudo passa… tudo mesmo. Apesar de dias ruins como o de hoje, eu ainda terei dias melhores.

Publicado em:Crônicas,Entretenimento,Noites de Insônia

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