Estou atualmente em férias no meu trabalho. E neste período de descanso e liberdade das amolações da escola, quero falar um pouco sobre um dos jogos que me fazem voltar a ser um garoto de 15 anos de idade. Apesar que, quando o jogo foi lançado eu já contava com quase 22 anos… Estou falando da franquia de jogos ambientadas em um mundo pós-apocalipse nuclear… a franquia de Fallout.
Fallout: a guerra nunca muda
Conheci o Fallout em 1997 quando ainda era aluno do curso de medicina na UNICAMP. Trata-se de um jogo em RPG ambientado em um futuro pós-apocalíptico destruído por uma guerra nuclear global onde você assumia a personalidade de um morador de um Vault (o famoso e mitológico Vault 13) os grandes abrigos nucleares de longa permanência.
Na história, os Vaults são habitações subterrâneas criadas antes do conflito nuclear para salva as pessoas. Estes Vaults foram lacrados e durante algumas gerações, a humanidade viveria lá até que o planeta se recuperasse do desastre nuclear. Sim… uma guerra de proporções planetárias, causada pela disputa desenfreada dos recursos naturais do planeta – em especial petróleo e urânio – levou a destruição do mundo como conhecíamos. Aliás, o início do jogo é um vídeo contando a história desta guerra e fazendo uma comparação com os outros conflitos mundiais. E é ali que surge a frase que define o jogo… War, war never changes.
Seu personagem nasceu no Vault e todos seguiam sua vida pacata até que um dia… puff… o chip do computador responsável pela purificação da água utilizada pelo Vault pifou e não existia uma peça de reposição. E a coisa era muito simples e objetiva: sem água… sem Vault.
E é neste ponto que começa a história do jogo Fallout. O supervisor do Vault o chama para pedir sua ajuda. Você deveria sair da segurança e tranquilidade do Vault 13 e ir até o Vault mais próximo (o Vault 15) buscar ajuda ou um chip para substituição. Armado com uma pistola e uma faca você sai do Vault e descobre que o mundo não acabou totalmente. Sobreviventes de vários lugares recomeçaram suas vidas e você descobre um novo mundo. Ao longo do jogo você descobre que além de encontrar o chip, deverá lutar contra mutantes e facções religiosas e contará com a ajuda de diversos aliados.
O grande barato do jogo é que você pode escolher seu perfil… você poderá ser um herói ou então um vilão. Tudo depende do seu roleplaying. Desta forma, o jogo pode tomar diversos caminhos diferentes e um final não é necessariamente igual ao outro. Quando joguei pela primeira vez eu fiquei no computador por 41 horas ininterruptas… um absurdo! Depois de uma semana eu terminei o jogo e em seguida eu recomecei (desta vez com um personagem malvado).
O jogo foi lançado para PC nas em versões para DOS, Windows e MacOS e contava com um sistema próprio de RPG (que foi baseado no sistema de RPG conhecido como GURPS) para criação do seu personagem: o SPECIAL. Acrônimo de Strength (Força), Perception (Percepção), Endurance (Resistência), Charisma (Carisma), Intelligence (Inteligência), Agility (Agilidade), e Luck (Sorte) . Esses são sete atributos básicos de cada personagem no jogo. Eles são usados para determinar as habilidades e as perícias dos personagens. Além disso, você poderia definir as habilidades do seu personagem entre as 18 diferentes existentes no jogo. E conforme você vai jogando, pode evoluir uma delas, ou algumas de modo a se tornar um especialista, ou até mesmo todas, tornando-se um generalista.
Além dos atributos e habilidades, temos também as perícias que trazem coisas boas e ruins. Assim, você pode – por exemplo – optar por ser um personagem ágil, mas ao mesmo tempo com pouca força. São escolhas que definirão o seu estilo de jogo, suas decisões e as interações que você terá ao longo do jogo.
A tela do jogo segue uma perspectiva isométrica e você controla as ações do jogo com o mouse e atalhos de teclado, mas se você quiser dá pra fazer tudo pelo mouse. Os gráficos são compatíveis com o que havia de disponível para a época e um Pentium 90 MHz com apenas 8 MB de RAM já era capaz de rodar o jogo satisfatoriamente. Mas eu fui um atrevido que joguei usando inicialmente um 486 com apenas 12 MB de RAM. E apesar da lentidão para carregar algumas fases do jogo, era possível jogar com um bom grau de diversão.
E no jogo você interage com outros personagens por meio de janelas de diálogo – que podem ter animações em vídeo, por meio do painel de ações e clicando nos objetos e personagens disponíveis. Ok, admito que não era o melhor dos gráficos, mas a história do jogo era bastante cativante. E a produção do jogo caprichou apostando em atores famosos para as dublagens de personagens… Ron Perlman da voz ao discurso de abertura na introdução do jogo. Richard Dean Anderson (o MacGyver!) interpreta o prefeito de uma cidade e Tony Shalhoub (o detetive atrapalhado da série Monk) é o líder de um vilarejo.
O jogo é repleto de histórias paralelas e de reviravoltas. Quando você pensa que a história caminha para um determinado rumo, algo lhe mostra o contrário. E a beleza do jogo reside em boa parte aí. O fato é que a procura pelo tal chip avariado é só o começo e a história. Você descobre que o mundo ainda existe e que uma nova ordem política e social existe. Bem como novas formas de vida.
O jogo mistura drama, ação, comédia e é repleto de referências culturais. São referências a Coca Cola (aqui conhecida como Nuka Cola), Conan, Dune, Doctor Who, Hulk, Jogos de Guerra (o filme), Mad Max, Planeta dos Macacos, Pulp Fiction, Simpsons, South Park e muitas outras menos óbvias. A própria contextualização do universo de Fallout segue a paranoia nuclear que assolou os EUA na década de 50, principalmente a antologias de histórias “Mundos do Amanhã” que contou com autores como Arthur C. Clarke e H.P. Lovecraft, Mack Reynolds e Willian Tenn e cria uma realidade futurística de como seria o mundo no futuro nesta visão. Assim temos uma realidade bem divergente da nossa realidade e ao mesmo tempo assustadora. O jogo explora bem a ideia de “jornada do herói” e ao final você precisa se envolver em um conflito que pode destruir o mundo… novamente.
Fallout 2: o mundo pós-Vault
Com o grande sucesso do jogo, a ideia de uma sequência era bastante natural. E ela leva em conta alguns fatos do jogo anterior. Não tem como esconder o spoiler. Então, lá vai: não importa o que aconteça em Fallout 1, mas ao final do jogo, seu personagem é expulso do Vault em que ele vivia e assim ele é obrigado a viver pelas terras devastadas até se estabelecer mais ao norte fundando a comunidade de Arroyo.
Os eventos de Fallout 2 acontecem 80 anos depois do Fallout original. Curiosamente, a comunidade fundada pelo Vault Dweller (como é apelidado o personagem do primeiro jogo) retrocedeu a um estado praticamente tribal, com direito a um xamã e até mesmo uma espécie de ritual de maioridade. Desta vez, sua vila está passando por grandes dificuldades, fome, doenças, escassez de recursos. Tudo parece estar perdido, mas a líder da tribo conhece uma antiga lenda sobre um dispositivo que pode salvar a aldeia. Trata-se do GECK, ou para os menos íntimos, Garden of Eden Creation Kit.
Peraí… corta para a Intro!
Pois é… antes de tudo isso, temos a introdução do jogo, da mesma forma que o primeiro jogo. E o filme é uma espécie de filme institucional de instruções para os habitantes do Vault. Ele contém instruções sobre como deixar o Vault em segurança e recomeçar o mundo utilizando o tal GECK.
Aí a introdução corta para o momento em que um destes Vaults abre suas portas para este tal recomeço. E qual não é a surpresa quando esperando por eles, alguns soldados vestindo suas Power Armor abrem fogo contra os habitantes do Vault. Você não sabe a razão, você não sabe de onde vêm estes soldados. E só aí entra a narração inicial do jogo contando sobre as agruras do seu vilarejo.
Um furo na história?
Pois é… essa parte é que o jogo peca um pouco. Como pode um grupo de pessoas que saíram de um abrigo nuclear altamente tecnológico puderam regredir a um estado tribal em apenas 80 anos? Além disso, como o Vault Dweller originário não usou seu conhecimento sobre tudo que encontrou no primeiro jogo para seguir seu caminho?
Apesar disso, o jogo traz algumas mesmas localidades do jogo original. Shady Sands se tornou uma próspera cidade conhecida como New California, uma grande cidade foi estabelecida com o uso do GECK no Vault 8, que deu origem à Vault City. Surgem outras cidades e assentamentos e você descobre a certa altura do jogo que os Estados Unidos da América ainda existe. Mas, pelo menos no território que pertenceu aos EUA, novas facções surgiram… O poder era descentralizado e muitas funcionavam como cidades-estados. O jogo não mostra, mas é presumível que o mesmo aconteceu em todos os outros territórios.
Voltando ao jogo
Como você já deve ter percebido, é muito fácil se perder pelos diversos aspectos do universo que foi estabelecido em Fallout. Mas, focando no jogo, ele tem a mesma estrutura do jogo original. Ele continua funcionando como um RPG de mundo aberto que passa a funcionar como um jogo de turnos durante os combates. O sistema de criação de personagem é o mesmo e a interface da tela igualmente. Claro, trazendo algumas melhorias em relação ao layout original.
E do mesmo jeito que o jogo original, temos uma história inicial, que depois nos mostra uma intriga muito maior, trazendo reviravoltas impensáveis na história e transformando sua missão de salvar sua aldeia em uma missão para salvar o mundo.
O que muda mesmo é a história, os locais. os personagens. É uma sequência legítima e com certeza traria novas sequências, não fosse um detalhe… a empresa que criou Fallout 1 e 2, a Interplay, foi vendida após sérios problemas financeiros. Já havia um terceiro jogo em desenvolvimento, mas ele foi cancelado. E em 2004 a Interplay fechou as portas. E isto teria sido o fim da franquia em definitivo.
Fallout 3: a franquia renasce
Em 2006, a Bethesda comprou os direitos da franquia e tratou de desenvolver uma sequência para o universo de Fallout que foi apresentada em outubro de 2008. Fallout 3 tem os mesmos elementos e é ambientado no mesmo universo do jogo original. Mas é um jogo que chegou quase 12 anos depois e obviamente não seria possível ignorar o desenvolvimento do poder computacional de todos estes anos.
Assim, Fallout 3 reinventou toda a interface do jogo, mantendo o RPG de mundo aberto, criando um sistema de criação de personagem parecido com o sistema original, mantendo os diálogos (que agora são cinemáticos) e criando um sistema de combate em tempo real que permitia usar algumas das características do combate por turnos. Mas não se engane… Fallout ainda era um jogo de RPG digital, mas tinha agora um componente indiscutível de jogo de ação tipo FPS.
Mas a troca de um jogo puramente RPG para um jogo de RPG mesclado com um FPS. Aquilo que imaginávamos nos primeiros jogos era visível nesta sequência. Você poderia andar pelas ruínas das terras devastadas, entrar em determinados locais, interagir com outros personagens, E os gráficos eram deslumbrantes.
Os eventos de Fallout 3 se passam 36 anos após os eventos de Fallout 2, portanto cerca de 116 anos após os eventos do jogo original. E é bom lembrar que a grande guerra que deu origem a tudo é de 2077. Ou seja, quando Fallout 3 acontece, já se passaram 200 anos desde que tudo aconteceu.
Todo mundo está ali… mutantes, ghouls, humanos, vaults, assentamentos que surgiram entre os sobreviventes, tudo. Nesta história, você nasceu dentro de um Vault localizado nas cercanias de Washington D.C. Você é um morador do Vault 101. Toda sua vida, toda sua história se passa no interior deste Vault.
Aliás, essa foi a maneira que a Bethesda encontrou para introduzir o sistema de criação do personagem. Seu nascimento é mostrado como uma sequência do jogo e ali você tem acesso as primeiras características do personagem, como aparência, nome, gênero. Depois você passa por algumas cenas da sua infância onde você define os dados do SPECIAL, as habilidades e todo o resto. As novidades estão por conta do sistema de Karma que pode ser bom ou ruim e que afeta seu relacionamento com os outros personagens do jogo e o sistema VATS para que você possa simular o sistema de turno dos jogos originais.
Você se dá conta que é filho do médico do Vault, James (no jogo o ator Liam Neeson dá voz ao personagem) e que vive em relativo conflito com o supervisor. Um dia, logo quando você alcança a vida adulta, você é subitamente acordado pela sua amiga/quase namorada Amata que é filha do supervisor. O Vault está em emergência, pois James fugiu do Vault e as ordens são para prender você, vivo ou morto. Sem opção, você é obrigado a fugir do Vault e sair a procura do seu pai.
E então você descobre que o mundo além das paredes do Vault ainda existe e – de certa forma – está prosperando. Você descobre aliás, que a maioria dos Vaults estão se despedaçando e ou já estão destruídos e o Vault 101 é uma espécie de remanescente dos velhos tempos. E facções como Brotherhood of Steel e Enclave estão de volta e desta vez eles são os grandes protagonistas da história, apesar de você ainda ter que lutar contra os mutantes que ainda restam pelo mundo. Você também interage com os ghouls e é claro, após encontrar o seu pai, você descobre que você está dentro de uma trama muito maior do que você imaginava.
Da mesma forma que os jogos anteriores, vários são os finais possíveis e suas escolhas podem refletir diretamente no final. E ao final, você pode ser ver sozinho novamente. Mas esta é apenas uma das possibilidades.
O jogo está disponível não só para PC, mas também para os consoles PS3 e Xbox 360. E no caso do PC, você pode jogar pelo teclado, ou usar um controle. Se for jogar no PC, tenha em mente que você irá precisar de um bom PC. Ele pede no mínimo um Pentium 4 de 2,4 Ghz, sendo o recomendado um Core 2 Duo. Ele também requer 2 GB de RAM e uma placa de vídeo compatível com Directx 9.0c com 256 MB de VRAM.
Apesar do jogo ter sido lançado em 2008, só recentemente eu consegui comprar minha cópia. Aliás, na ocasião do lançamento, eu nem tinha um PC com requisitos mínimos para jogar. Também não tinha um console. Então a solução foi convencer o meu cunhado a comprar o jogo para o PS3 dele. E aí eu só consegui jogar Fallout 3 de modo a concluir o jogo nas suas missões principais. E só agora é que eu estou explorando todas as possibilidades do jogo. Você pode conhecer um pouco da jogabilidade conferindo este trailer.
E com os DLC’s que foram lançados em 2009, o jogo ficou ainda maior. Novas missões adicionais, novas possibilidades e até mesmo a possibilidade de continuar jogando, mesmo que você tenha concluído o objetivo do jogo.
E o futuro?
Lembra quando eu disse lá no começo que Fallout me faz ter a sensação de um adolescente de 15 anos? Pois é… Fallout já é uma franquia com quase 13 anos de história. Saiu da interface 2D e migrou para o 3D com muita naturalidade. Conseguiu entrar para a história dos games. E bom… há dois dias esta história conta com um novo capítulo. Foi lançado Fallout New Vegas. E eu não vejo a hora de por as mãos no jogo. Assim como um moleque de 15 anos estaria sabendo que seu jogo favorito ganhou uma continuação.
Como todo lançamento ele chega ao mercado custando uma pequena fortuna. Então vou esperar o burburinho inicial passar e esperar por uma boa promoção. Enquanto isso, vou me contentando com o trailer do jogo. Que promete uma história fantástica.
Estamos prontos para ele?