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Uma visita à outrora jóia do Caribe

Claro que Cuba não é um país comum. Talvez nenhum seja, mas a ilha do Caribe nos instiga e gera sempre debates acalorados, daí ser sempre trabalhoso – para dizer o mínimo – falar sobre Cuba. Mas lá habitam seres humanos que são comuns, levam uma vida comum ou pelo menos tentam em meio às tantas limitações de um país pobre da América Central.

As histórias de "Quatro Estações em Havana" contadas no outrora balneário chique
As histórias de “Quatro Estações em Havana” contadas no outrora balneário chique

Havana, sua capital, já viveu dias de glamour. Outrora um balneário chique para onde acorriam milionários em busca de esbórnias com gosto de charutos, rum e sob um ritmo contagiante, hoje é uma cidade sucateada. Mas a série “Quatro estações em Havana”, do Netflix, garimpada por “Sem Pipoca” nesta Quarentena, conta uma boa história policial. Em Havana.

A história

A série é uma grata surpresa. Porque se permite partir de uma história interessante, bem construída e nos apresenta a cidade e o país como panos de fundo. As tramas pessoais para além dos crimes que acontecem, são o centro das atenções. Somos apresentados à figura do Tenente Mario Conde, policial veterano, melancólico, cínico e implacável mais consigo que com os criminosos.

Dele sabemos que mora num quarto de pensão, onde moram seus amigos, dentre eles um cadeirante que assim ficou depois de ter servido na guerra de Angola. É perseguido por fantasmas do passado – ele se define como “um nostálgico de merda” – que volta e meia turvam seu raciocínio na condução das investigações. Mas seu fraco é por mulheres, por lindas mulheres.

O protagonista da história, tenente Mario Conde. Um cínico
O protagonista da história, tenente Mario Conde. Um cínico

Os episódios mostram a cidade sob várias perspectivas, mas as tomadas aéreas em semi-close das diversas áreas da cidade aparecem como pontos de ligação, e tem sua beleza. Sim, há muita pobreza, mas também há muita cor, calor e uma gente quer viver, não apenas aguentar. Em cada episódio um crime ocorrido em determinada área da cidade.

O Tenente Conde trabalha quase de má-vontade, inicialmente com pouca energia, mas vai se empolgando junto com o desenrolar da história e nos leva junto para um auge que depois vai numa rápida descendente para terminar com desolação e melancolia. Conde não é um herói. Só quer fazer o seu trabalho direito.

A série se passa nos anos de 89 – 90, com o mundo sentindo a Queda do Muro de Berlim. Estes ventos também sopram em Cuba. Assim, novos parceiros comerciais são procurados, muito dinheiro internacional que não o Russo começa  a passar por mãos de burocratas do partido e daí surgem crimes do Colarinho Branco, aumenta o tráfico de drogas, a corrupção policial e a violência. Ninguém é completamente santo ali, tampouco as vítimas dos crimes investigados por Conde. Aliás só viraram vítimas porque assumiram viver no limite, seja de que forma for.

Por que vale a pena assistir

Se há um adjetivo para qualificar “Quatro Estações em Havana” este adjetivo é “honesta”. Não se nega a mostrar Cuba, suas nuances, seu passado e seu presente. Não se nega a mostrar como a sociedade reage ao impacto de ali residir, como a mulher carente cujo marido está em outro país trabalhando no Programa Mais Médicos e se vê compelida a traí-lo. A série enfim não se nega a contar em quatro episódios, histórias policiais com personagens ricos porque são falíveis, perturbados, com rompantes desesperados mas com alívios mundanos e assustadoramente comuns mas nem por isso menos interessantes.

O resultado é bom e agrada. Vale a visita à outrora “Jóia do Caribe”, que talvez tenha perdido o brilho mas nunca o interesse, para além das brigas ideológicas.

Serviço

“Quatro estações em Havana” (Cuba, 2016) Direção: Felix Viscarret; Roteiro: Leonardo Padura; Elenco: Jorge Perrugorría, Carlos Enrique Almirante, Juana Acosta. Em exibição no Netflix.

Post Scriptum

A trilha sonora é sempre um caso a parte em se tratando de histórias passadas em Cuba. Não é diferente nesta série, com musica cubana da boa trazendo clássicos como Silvio Rodriguez e a cantora contemporânea Cocu Diamantes além de Tejedor y su conjunto que parece um achado da série. Mas também traz (muito) Creedence Clearwater Revival.

Publicado em:Opinião,Sem Pipoca

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