Menu fechado

Eu fui ao show de Milton Nascimento!

Buenas povo! Parafraseando o lendário Adoniram Barbosa: “Ó nóis aqui travêiz!”. Hoje não venho para falar de nenhum lançamento, mas sim de uma experiência pra lá de especial: Milton Nascimento tocando o indefectível “Clube da Esquina” ao vivo. É isso mesmo que você leu. Eu vi Milton Nascimento, o famoso Bituca, tocando o álbum mais clássico da música popular brasileira (opinião deste que vos escreve) ao vivo, in loco, com banda. E meus amigos, que espetáculo!

O show aconteceu em 23/04/2022 l[a na cidade de Guarulhos
O show aconteceu em 23/04/2022 l[a na cidade de Guarulhos

Mas antes…

Preciso contextualizar a minha relação com a obra do grande mestre Bituca antes de falar propriamente sobre o show. Desde molecote, aos sábados, durante a arrumação da semana, mamãe nos transbordava com enormes doses de música brasileira: De Chico Buarque à Legião Urbana, passando por mais uma infinidade de bambas da MPB e do samba. Por anos e anos a fio. Quando me tornei adolescente, as guitarras começaram a dar o tom na minha vida musical e aquele repertório clássico das manhãs de sábado ficaram de lado.

Mal sabia eu que aquelas músicas ficaram por lá, enraizadas, guardadinhas no fundo do meu subconsciente e que elas tinham criado um latifúndio na minha memória musical, mesmo que desde muito novo a minha aproximação com o rock foi algo fulminante. Identificação total, com a sonoridade e com a estética, mas a música brasileira sempre esteve presente, era a trilha sonora da casa da minha mãe.

Pois então, 2020, pandemia, isolamento social e numa das tardes de trabalho, o modo aleatório do YouTube começa a me sugerir diversos vídeos de artistas brasileiros da década de 70, e o agora adulto, sem as amarras e o preconceito do adolescente rockista, se deixa levar pelas sugestões e cai de cabeça nessa viagem temporal. E gente, que viagem!

Descobri e redescobri um mundo que ao mesmo tempo que me soava novo e com um frescor que eu jamais havia experimentado, muitas daquelas sonoridades já estavam enraizadas na minha mente e quando percebia saía cantarolando o que já conhecia desde criança. Mesmo tateando no escuro, era um terreno que me soava familiar. Entre todas as pérolas conhecidas e redescobertas, nada me chamou tanto a atenção como a obra de Milton Nascimento.

Comecei a ouvir disco após disco sua obra e a cada música que começava era uma explosão de sentimentos que iam da surpresa à nostalgia. Esse sentimento virou uma catarse quando começou a tocar o “Clube da Esquina”. Mesmo sem saber, eu conhecia aquele repertório todo. Mamãe cantarolava aqueles clássicos durante toda a minha infância, e a cada música que passava, uma nova lembrança que há tempos estava escondida se revelava. Que viagem!

Nem preciso dizer que o disco virou um predileto da casa e que está inserido no mais alto panteão da minha discoteca básica, ocupando aquele posto de disco que você levaria para uma ilha deserta.

Findo o recorte temporal e voltamos para dezembro de 2021.

Agora sim… minha experiência com o Show

Assim que fiquei sabendo dessa turnê de 50 anos do álbum fiquei doido para fazer parte disso, de presenciar essa celebração. Fiquei com cara de besta quando ganhei da minha esposa um ingresso como presente de natal. Ansiedade a mil, o show que estava agendado para o fim de janeiro fora reagendado para abril por causa da ainda duradoura pandemia, mas enfim o grande dia chegara.

Sábado, 23/04/2022, 22:30.

Pontualmente Bituca sobe ao palco acompanhado de Zé Ibarra (violão e vocais), Wilson Lopes (violão, guitarra e direção musical), Alexandre Ito (baixo), Christiano Caldas (piano), Widor Santiago (metais) e Lincoln Cheib (bateria). Aos primeiros acordes de “Tudo o que Você podia ser”, a música que abre o show (e o disco), a plateia já estava ganha. A cada nota, a cada refrão, a cada música, Milton mostra porque é um dos maiores nomes da música brasileira de todos os tempos. Sua voz continua incomparável. Mesmo que a presença de palco não seja mais a mesma de outrora, apena a sua presença e voz já bastam para arrancar os mais sinceros sorrisos (e lágrimas, muitas lágrimas) dos presentes.

Mesmo com o repertório calcado no disco de 1972, ainda sobra espaço para algumas pérolas que não eram do “Clube da Esquina”. “Paula e Bebeto”, mesmo 47 anos depois de lançada ainda se faz atual, relevante e necessária (“Qualquer maneira de amor vale a pena, qualquer maneira de amor vale amar”).

Mesmo dividindo os vocais com Zé Ibarra, que no contexto do “Clubde da Esquina” faz as vozes de Lô Borges, o show não perde em nada da sua essência. Aquelas músicas tem uma força atemporal e ao olhar para os lados, percebo que cada um tem uma reação com cada nova canção que era entoada. Fora do repertório do disco, “Maria Maria” é cantada em uníssono à plenos pulmões por todos os presentes, e ao vivo a música se torna ainda mais poderosa, quase uma prece. Nesse momento, o que se viu de filhos abraçando suas mães não estava escrito.

Depois de uma hora e meia de hipnose coletiva, alguns causos sobre a amizade dele e Lô Borges, da gravação do disco e de clássicos como “Um Girassol da Cor de Seu Cabelo”, “Trem de Doido” e “O Trem Azul” que fizeram latifúndio na minha cabeça e nas minhas mais tenras lembranças, Milton já com o jogo ganho, termina o show prometendo para esse ano ainda uma nova turnê, a que marca o seu aniversário de 80 anos e a sua despedida dos palcos.

Atemporal como todos os clássicos, hipnótico como um culto, essencial como toda a obra-prima. Obrigados: Milton (pelo show), Mãe (pela bagagem musical) e Nicoli, meu amor (pela surpresa/presente).

Logo menos tem mais.

Publicado em:Disco da Semana,Opinião

Conheça também...